segunda-feira, 19 de setembro de 2022 1 comentários

Volta ao presencial, ainda que gradual

 


A empresa onde eu trabalho,  estipulou um modelo híbrido de atuação, para os funcionários administrativos. Em certas fases, chegou a ficar 100% home office.

Confesso que o home office me trouxe mais benefícios do que transtornos. Dentre eles, posso citar :

  • Nos dois primeiros anos da pandemia, pude passar um bom tempo com minha mãe, ficando na mesma casa e fortalecendo nossos laços. Isso foi crucial, pra que eu sentisse que estava próximo dela, nos últimos anos de vida ;
  • Pude passar semanas inteiras com meu namorado, na minha casa, intercalando a rotina de trabalho, com estudo e relacionamento ;
  • Consegui concluir uma pós graduação e avançar em duas graduações EAD. Talvez, na era do presencial, faltasse energia pra gerenciar este tempo livre ; 
  • Consegui me dedicar mais a alguns hobbies, como leitura, jogar xadrez online e cozinhar ;
  • Foquei mais do que nunca em tornar minha casa confortável ;
A questão agora é aceitar esta volta gradual ao presencial. Ainda mais com a empresa indo pra um bairro de difícil acesso para pessoas PCDs. Me desgastar fisicamente e perder horas em trajeto trabalho x casa, atualmente, pra mim, é atraso de vida.



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Morte em Veneza, beleza e Marissa Cooper

 


Continuando a linha de raciocínio da postagem anterior, assisti detalhadamente o documentário que traça a vida do ator que interpretou Tadzio, em Morto e em Veneza, como também uma provável " maldição " pelo fato de a mídia e a sociedade tratarem o adolescente como " o garoto mais lindo do mundo ".

Um livro, que pretendo terminar, e que trata deste tema, de forma magistral é o " Beleza ", do falecido filósofo Roger Scruton. Nesta obra, me lembro bem, que ele compara a beleza com outras dádivas da existência, como riqueza material, talentos e virtudes. Que é preciso uma estrutura emocional, para que a pessoa saiba lidar com a própria beleza, com o assédio constante e com as portas, que podem se abrir e se fechar rapidamente.

Bom, no documentário, percebi que a vida do Bjorn nunca foi fácil, desde a infância. A mãe, foi morta brutalmente, com ele ainda criança. O pai, era desconhecido. A avó, com quem foi criado, era ávida pela fama e pelo dinheiro. Aos 15, aparece a oportunidade do teste, no filme do diretor Visconti.

Dentro do próprio enredo do documentário, mostra um adolescente praticamente entregue pela avó à correnteza da fama. O filme estreou no Festival de Cannes, de 1971. Foi citado também um contrato de exclusividade do diretor com o jovem ator, até que completasse 18 anos. Bjorn narrou ir a uma boate gay, com o diretor ( assumidamente gay ) e que não gostou do lugar, tendo bebido até ficar inconsciente. Depois, ao atingir a maioridade, foi bancado por vários fãs, na sua maioria homens, que o desejavam e chegou a morar em Paris.

O que não ficou muito claro e talvez o criador do documentário não quisesse entrar em polêmicas, foi se Bjorn teve relações sexuais e afetivas com outros homens. Ou eles queriam apenas a companhia dele? No mínimo estranho. Às vezes, fica meio que implícito no longa, que houve sim... em outras vezes, não fica tão claro. Depende de quem interpreta.

Casou com uma mulher e teve dois filhos. Um deles, morreu precocemente, por descuido do próprio pai, segundo relato de Bjorn. E tudo virou um turbilhão. Culpando o álcool, a falta de afeto e pasmem : a fama de ser chamado de mais bonito do mundo, na juventude. Realmente, a psicanálise é um poço sem fundo. Pois, particularmente, não consigo enxergar esse castelo de cartas kármico, da forma que ele narrou. Atualmente, com 68 anos, namora uma mulher mais nova e aparenta ter mais idade, talvez pelo hábito incessante de fumar.


E nessa semana, estava eu relembrando algumas músicas antigas e lembrei da série The OC. A personagem Marissa Cooper ( Mischa Barton ) povoou meu imaginário, nos meus 20 anos. Eu a achava a garota perfeita, com uma beleza sublime, esperta e com uns valores bem a frente do seu tempo. Na época ( 2005 ), eu tinha várias dúvidas sobre ser hetero, gay ou bissexual. Não existiam muitas pessoas pra conversar sobre, tampouco personagens na TV e no cinema que pudessem validar algum comportamento na vida real. Era um grande silêncio. 

Até que o beijo de Marissa e Alex, em The OC, na terceira temporada, fez com que eu entendesse melhor a questão da bissexualidade. Marissa Cooper não virou lésbica ou passou por transformações físicas ou comportamentais. Apenas demonstrou interesse em outra garota e continuou sendo como era, até mesmo namorando garotos depois. Aquilo teve uma importância imensa pra mim. Comecei um processo de formatar a demonização da homofobia internalizada, plantada pela família e sociedade. Ao ver Marissa Cooper meio que " surfando " sobre os preconceitos e inseguranças da sociedade, eu vi que era possível eu me arriscar. E principalmente: Se não fosse o que eu realmente queria, poderia traçar outro caminho. Tanto que no ano seguinte eu comecei a ter atração por um amigo, que viria a ser meu primeiro namorado ( 5 anos juntos, de 2008 a 2013 ).

Pesquisando mais sobre essa personagem, vi que a atriz entrou num espiral parecido com o do Bjorn Andresen. Começou na série, com 16 anos. Foi muito assediada, segundo ela, até mesmo nos sets de filmagem. E ao sair da série, se envolveu em várias polêmicas, até chegando a ser detida pela polícia.

Achei coincidência demais, pois pra mim, ela sempre será " a garota mais linda do mundo ".


 


terça-feira, 30 de agosto de 2022 0 comentários

Encantamento





 Em 2021, li meu primeiro livro de Thomas Mann : Morte em Veneza. A obra talvez seja a mais marcante que já li até hoje. O autor tocou num tema crucial e tive a sensação de como ele me entendesse ou vice versa.

A questão da busca não só pelo belo, mas do sublime, me acompanhou desde o início. Eu só não sabia. Tive pelo menos 4 oportunidades de me deparar com uma sensação assim. De me deparar com alguém que reúne todo o imaginário dentro de mim e até de descobrir o que eu gostava e não sabia. Foram divisores de águas. Em todas as vezes, me vi à deriva, a mercê do objeto de desejo, inoperante, paralisado. Entendo totalmente como o Gustav von Aschenbach se sentia na obra de Thomas Mann.

Em todas as oportunidades, eu sentia, mesmo que inconscientemente, que aquela relação poderia me levar à total destruição. Tomava decisões precipitadas. Estava ansioso, com medo de perder cada momento. Trocando os pés pelas mãos. Era como se eu tivesse voltado a ser criança ou tivesse me tornado um idoso com sérios problemas cognitivos. Manter aquilo por muito tempo não seria sustentável.

A última vez que isso ocorreu comigo, foi em 2017. Parecia que estava enfeitiçado. Apressei tudo e me deixei dominar pela insegurança. Mas não posso deixar de refletir em como essas pessoas dizem muito sobre mim. O quanto fui afetado por elas. Nunca mais fui o mesmo.

Quando li Morte em Veneza, ficou muito marcado pra mim, ouvir Tomaso Albinoni ( veneziano, coincidentemente ). Acho que teria sido uma ótima trilha sonora pra esta grande obra. Recomendo também o filme , do diretor Luchino Visconti.





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Adocicado

 



Acordamos depois do meio dia. É final de semana.

 Se eu não o acordo, passa das 14hrs. Vamos fazer um café? Ele aprendeu a fazer na Cafeteira Italiana. Moemos o café na hora e sai aquele cheirinho delicioso. 

O que comeremos? Ele prefere cereal ou pão suíço. Eu, prefiro biscoito de arroz, com cream cheese ou torrada Petrópolis.

Assistimos alguma futilidade no Youtube. Conversamos. 

Começo uma partida de xadrez online e ele, um dos jogos multi players da atualidade ( como LOL ).

Pediremos almoço ou prepararemos algo na cozinha ? Tanto faz. Comemos juntos.

Dá aquela preguiça depois do almoço e só não dormimos, porque acordamos muito tarde.

Assistimos algo no streaming. 

Hora de dar uma arrumada na casa. Eu tiro o pó, com aspirador e pano. Ele, lava a louça.

Os dias passam bem devagar e de forma branda, quando ele está por aqui.

Estamos sempre perto. Deito por perto e peço um afago. Me chama de carente, pra me provocar.

Dificilmente saímos. Pergunto se quer sair. Diz que não. Prefiro ficar em casa também. A pandemia, dentre muitos males, trouxe algumas compensações, como tornarmos a nossa casa mais confortável.

Quase sempre reparo em como me sinto nessa relação. Levemente adocicado. Sem ter medo de parecer vulnerável. Sem precisar me afirmar sempre. Sem queda de braço desnecessária. Sem discussões inúteis.

Talvez seja o máximo de tempo que consegui me sentir seguro, comigo mesmo. Sem achar que estava " dormindo com o inimigo ". Tive experiências longas de estar com pessoas que não me enxergavam ou que estavam comigo por motivos secundários. Ser eu mesmo, me traz um alívio e uma leveza imensa.

Estar com alguém 15 anos mais jovem tem vários pontos interessantes.  Mas o engraçado é que temos o mesmo ritmo nos principais aspectos da vida. No mais, não fujo da responsabilidade que é " ser o mais experiente ".

E lá se vão 4 anos. Ano que vem, ao que tudo indica, se tornará meu relacionamento mais longo.




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Cortando contato / Sonhos com minha mãe

 


Já são 8 meses sem ela. 

Parece que cada dia às vezes passa muito devagar. Às vezes, rápido demais.
Lembrar que a pessoa que me trouxe à vida não está mais neste plano, me recorda diariamente, de que eu também estou morrendo.
Muita coisa perdeu o sentido. Aturar certas coisas, certas pessoas, certas situações...
Eu mantive, mesmo a contragosto, muitos vínculos, apenas por aparência, pra agradar minha mãe. A partir do momento em que ela parte, tudo se desfaz.

A relação com meu pai sempre foi distante. Mesmo ele estando sempre perto, emocionalmente nunca esteve. Sempre foi utilitarista. Nunca deixou faltar nada no quesito material, mas em relação a afetos, era avarento e tóxico. Nos últimos anos, me vi no dever de abrir os olhos da minha mãe pra certas atitudes dele. Creio ter conseguido. Mas queria ter mais tempo com ela, pra vê-la se libertar do narcisismo e da manipulação emocional dele.

Cortei qualquer tipo de contato com meu pai, há mais ou menos dois meses. Dei várias chances, pra ver se ele melhorava como pessoa, após ficar viúvo. Mas sempre se mostrou incapaz de ouvir, de acolher, de ter o mínimo de empatia. Espalhou várias histórias tendenciosas, se aproveitando que minha mãe não estava perto pra desmentir. 

Arquei com todos os custos do funeral da minha mãe. Ao mudar de residência, tive um aumento nos meus gastos e sem minha mãe pra me ajudar em algumas tarefas, onde tenho limitações físicas. Meu pai passou a pagar uma diarista pra casa dele. Depois, descobri que além de um salário razoável pra quem nunca fez mais que o ensino médio, ele conseguiu uma boa quantia referente a um seguro de vida e estava recebendo uma pensão do INSS pela morte da minha mãe. Tudo isso bem quietinho. É como se eu fosse filho dele. Um nível de sociopatia bem elevado. Tudo isso somado a homofobia, misoginia e avareza. Me dei conta que estar perto tinha um custo muito alto pra mim e pra minha saúde. Fiz o que ela não teve coragem de fazer.

Algumas semanas antes de ela ser internada, ela estava muito triste com uma série de atitudes escrotas dele e cogitou separar. Me coloquei a disposição, pra que ela tomasse o rumo que quisesse, sem se preocupar com a questão financeira. Ela chegou a informar que iria separar e ele fingiu que desmaiou. Não sei o que aconteceu, mas ela ficou com um pouco de pena ou achou que iria me sufocar financeiramente e acabou ficando na casa. Acredito que fiz a minha parte. Ela tomou sua decisão, sabendo que teria uma segunda opção. Uma forma de se ver livre daquela realidade. Isso, pra mim, não tem preço.

Concluindo a postagem, nestes últimos dias, tive dois sonhos com ela. Num deles, ela tinha ressuscitado. Voltado a vida, nos dias atuais. Fiquei tão feliz, que acordei com um sorriso, achando que era verdade. Agradeci a ela por ter aparecido e conversado comigo. Muita saudade.






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Primeiro dia com a nova medicação

 


Eu já estava tomando um medicamento " mais leve ", desde julho de 2021, quando tive o que pareceu um burnout, seguido de Covid 19. Essa medicação que eu tomava era pra dar motivação, de levantar, de fazer as tarefas cotidianas, etc. Bom, serviu em partes, pra que eu não caísse num limbo completo, mantivesse meu emprego e meus estudos, mesmo que precariamente.

A última psiquiatra que me consultei me alertou que eu não estava tratando uma das causas principais deste meu " eu atual ", que seria a tristeza/melancolia cotidiana. E me receitou uma outra medicação, que atuaria mais neste ponto.

Bom, a consulta foi há três meses e só fui tomar a primeira pílula hoje. Sou meio pé atrás quanto a dependências ou reações. Mas cheguei num ponto de letargia tão acentuado, que resolvi seguir a prescrição da especialista.

Em 1 ano, além do burnout e da Covid 19, tive uma propensão a hipertensão confirmada e hoje tomo medicamentos pra controlar pressão. Ganhei peso, me isolei mais, o sedentarismo aumentou. Tive várias situações de stress e desapontamento com pessoas. Meus cabelos e barba ficaram grisalhos rapidamente. Senti que envelheci uns 5 anos em 1. A perda da minha mãe, em dezembro fez com que tudo virasse uma bola de neve. Cortei relacionamento com meu pai. Perdi o controle das minhas finanças pessoais e me endividei.

Claro que nem tudo foi ruim neste período : Continuei minha terapia, com um especialista que me entende melhor. Me mudei pra uma casa mais confortável e mais perto do metrô. Retomei contato com familiares que eu não falava há anos. Consegui formar uma biblioteca, como sempre sonhei. Concluí minha pós graduação. Me matriculei em um dos cursos de ensino superior dos meus sonhos ( Sociologia ). Meu relacionamento evoluiu bastante e completamos 4 anos juntos. Fizemos a união estável em abril e já fico mais tranquilo, por proporcionar alguns direitos a ele, como plano de saúde.

Gostaria de ter disciplina de escrever todo dia. Sei que me faria bem. Mas não consigo ser esse tipo de pessoa estável. Tenho procrastinado bastante. Espero que o medicamento faça um bom efeito.




segunda-feira, 14 de março de 2022 0 comentários

Caixa de Pandora

 


Quando me dei conta de que não precisava, necessariamente, escolher entre ficar com homens ou mulheres, achei o máximo. Aquela velha e batida ilusão de fartura, de que teria muitas e muitas opções de relacionamento. A realidade é outra. O caos psicológico supera a sensação utópica de "orgias imaginárias" com homens e mulheres.

Minha última namorada foi um episódio à parte. Quem lia meus blogs antigos e tem boa memória, pode ser que lembre. Ela também tinha blog, aliás. Há dez anos atrás, eu tentei um relacionamento à distância, com uma garota de 21 anos, do interior de SP, chamada Hellen.

Um acontecimento, que poderia ter sido banal pra muitos, acabou não sendo pra mim. Nunca me achei padrão de beleza e sempre vivi meio que deslocado nesse sentido. Meio que acreditava que não conseguiria conquistar certas pessoas e nem me dava ao trabalho de tentar.

Confesso que me apaixonei à primeira vista por ela. Quando vi fotos dela no blog, fui atrás das redes sociais. Era tudo o que meu imaginário nunca havia ousado desenhar. E veio aquela voz sabotadora/ ultra realista, falando baixinho na minha mente : 

- Esquece. Não é pra você. Perda de tempo. Além do mais, mora em outro estado e você é pobre.

Ainda assim, eu optei por alimentar essa paixão platônica e fui me aproximando. Nos tornamos amigos e ela sabia muito sobre mim, pois meu blog era quase um diário. Conversávamos diariamente pelo MSN. Acabamos encontrando um no outro, alguém pra desabafar certas coisas.

Até que num certo momento, nós estávamos solteiros ( algo raro ). E pensamos :

- Por que não ?

As conversas ficaram mais apimentadas e a convidei pra vir ao Rio. Passamos um dia mágico juntos e levei ela até a família dos pais, que ela não conhecia, numa cidade vizinha aqui.

Acabamos discutindo depois. Não entendemos o tempo um do outro e houve um desencontro. Um relacionamento a distância, quando vem pra perto, meio que há um choque de realidade. Não tivemos maturidade pra lidar com isso.

Além do mais, o que eu poderia oferecer? Não poderia pedir pra que ela largasse a mãe e viesse pro Rio. Ambos estávamos enraizados em nossas cidades. Aquela impossibilidade foi, talvez, o maior balde de água fria que eu já tive na vida. Me vi obrigado a amadurecer, aos 27 anos. Não queria mais sentir aquele caos, de não saber lidar com aquela negativa da vida.

Dez anos se passaram e ainda mantivemos contato. Ela ainda mexe com meu imaginário. Não é nenhum segredo e eu até divido os devaneios com meu namorado atual. É um lado meu que imagina como poderia ter sido. Não querendo mudar, não querendo voltar no tempo, não estando ( jamais ) insatisfeito com o hoje. Mas apenas me permitindo imaginar como seria essa vida.

Pessoas diferentes nos levam a destinos diferentes. Isso parece óbvio. Mas ter uma rotina hetero normativa é algo bem desafiador.

Das três garotas que namorei, ela é a que mais se parece comigo. Talvez por isso, às vezes rola um stress. Gostaria de vê-la novamente.

Em dez anos, muita coisa muda. Quando a vi pela primeira vez, na rodoviária, ela iluminou tudo. Pensei que fosse desistir quando me visse. Ela não estava nem aí pra isso. Na verdade, queria ter alguém por perto, assim como eu, assim como a maioria de nós.

E aquele Eu, que poderia ter sido, meio que foi enterrado no dia de finados de 2012.

Enterro prematuro, por sinal.






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O universo chamado mãe - Parte 1

 


Há muito tempo não escrevo aqui. Sinto falta, às vezes.


Amanhã, dia 15, fará 4 meses que minha mãe partiu, aos 59 anos. Depois de uma certa idade, acabamos achando que estamos preparados pra este tipo de perda. Ledo engano.

Particularmente, eu nunca fui uma pessoa muito ligada à família, como um todo. Nunca me senti aceito, respeitado ou amado, como eu achei que deveria. Em troca, sempre agi com frieza e desdém. Acabei me esforçando pra me virar sozinho, desde sempre.

Minha mãe sempre cuidou de tudo. Nunca me faltou nada pra comer, nenhum brinquedo que eu quisesse na infância. Estudei em escolas privadas e públicas: nada com muita pompa, mas o suficiente pra sobreviver no futuro. 

Não tive irmãos. Sempre gostei disso, mas a conta chega nesse momento. Ter que lidar com isso sem ter com quem desabafar no mesmo patamar. O luto do meu pai é completamente diferente do meu. Não digo que ter um irmão, ajudaria neste caso. É apenas uma possibilidade. Aprendi vendo a família da minha mãe, que certos irmãos, às vezes mais atrapalham do que ajudam.

Fiquei um mês na casa do meu pai, tentando oferecer apoio e me apegando às memórias da minha mãe, que ainda estavam muito vivas. O cheiro, as coisas do jeito que ela deixou. Ainda tinha comida pronta na geladeira. As roupas que ela lavou ainda estavam limpas. Tudo estava esperando ela voltar do hospital, com vida. Mas não aconteceu.

Minha mãe foi a terceira, de oito filhos que minha avó gerou. Teve uma infância muito pobre. Me contou algumas vezes que tinha que catar do lixo alguma coisa pra comer ou vestir. Ninguém da família tinha estudo. Viviam da pesca e de outros serviços manuais. De uns tempos pra cá, eu quis compensar essa escassez que minha mãe teve no início da vida, com um pouco de conforto.

Os preconceitos vieram, muito em parte, dos meus avós maternos. Machismo, racismo, homofobia, tudo isso gerava relacionamentos tóxicos. Irmãos que se odiavam, na maioria das vezes. Filhos que não falavam com os pais. E tudo isso acabou respingando em mim. Demorei pra entender o efeito dominó. 

Minha avó materna faleceu em 2017. Coincidentemente, de lá pra cá, eu consegui me aproximar mais da minha mãe. Tive uma avó que envenenava minha mãe com os piores preconceitos possíveis, advindos da ignorância, da religião e do patriarcado. Foi um dos motivos de eu ter deixado de morar com meus pais : não ter mais que conviver com as visitas dela. Ainda assim, era uma base emocional pra minha mãe. Ela ficou muito enfraquecida com a partida da mãe e eu tentava estar perto, mas não conseguia ter muita empatia, pois fui muito prejudicado pela visão de mundo retrógrada da falecida.

O ano de 2017 marcou alguns pontos também. Era meu primeiro ano morando sozinho, de verdade. Me mudei pra morar com Guilherme e essa união, morando debaixo do mesmo teto, ruiu no primeiro ano ( 2016 ), após três anos de relacionamento. Lá estava eu tendo que me virar. Minha mãe, com a visão machista, sempre fez questão de deixar claro o que é " tarefa de mulher " e " tarefa de homem ". Desde pequeno, nunca precisei lavar louça, roupa, banheiro, etc. Inclusive acostumou meu pai assim. Com o tempo, eu vi que era algo particular dela e que eu precisaria me virar sozinho um dia. Aprender a fazer as coisas, me traria mais independência e eu não seria mais obrigado a ouvir ou aturar certas coisas. Foi aí que ela meio que sentiu no ar que o Guilherme não estava mais comigo. Se ofereceu pra voltar a lavar e passar minhas roupas. Aceitei.

Eu poderia ter dito não, mas ainda queria uma certa dependência em relação a minha mãe. Ela sempre foi adepta a jogos de poderes ( e herdei isso dela ) e essa troca de favores poderia nos aproximar. Sim, eu iria querer compensar o esforço e gasto dela comigo. E foi o que fiz.


Continuo no próximo post...






 
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